Psiquiatra e psicopedagoga comentam sobre desafios que crianças e adolescentes enfrentam com a retomada das aulas
“Os impactos da pandemia em variados aspectos” é uma pauta que vai se fazer presente e frequente nos próximos meses. Com a retomada das atividades em modelo presencial e com as recorrentes adaptações, seja com formatos híbridos ou com cuidados redobrados para evitar situações críticas de contágio pelo coronavírus, o ano de 2021 é de reinvenções. Um dos lugares em que esses ajustes se mostraram urgentes é na escola. Passado o primeiro semestre letivo, o momento é de colocar na balança os aprendizados e traçar métodos para rever os prejuízos que os alunos estão apresentando frente às recentes transformações e condições de ensino e aprendizagem.
A presidente da Associação Catarinense de Psiquiatria (ACP), Dra. Deisy Mendes Porto, explica que a interrupção de rotina e o isolamento social trouxeram impactos nas questões cognitivas, de raciocínio e, também, de alterações emocionais, até mesmo complicações com a saúde mental. “No consultório, acompanhamos casos de crianças que estavam apresentando maior dificuldade de absorção dos conteúdos, alterações de humor e ansiedade. As restrições impostas pelo isolamento, a ausência de um local ideal para estudo, a falta de interação com amigos, a suspensão das demais atividades de lazer trazem essas dificuldades. É importante que pais e professores observem se essas alterações estão persistindo e procurarem ajuda profissional, se observarem prejuízos.”, relata a psiquiatra.
A pedagoga e psicopedagoga, Márcia Fiates, explica que, com as aulas remotas, os alunos acabaram tendo uma solicitação menor de estímulos e interações, o que gerou um impacto no cognitivo. “Com a retomada das atividades presenciais, uma das primeiras percepções que tivemos em sala de aula é que os alunos ficaram menos participativos e mais retraídos, por conta da falta de estímulo, que é mais efetivo no modelo de ensino presencial.”, explica a pedagoga.
No último trimestre de 2020, por exemplo, momento em que os alunos estavam se preparando para a série seguinte, observou-se menor uso das funções cognitivas. A psicopedagoga destaca que esses aspectos comprometem fatores que vão além da sala de aula. “Quando falamos em imaturidade cognitiva, estamos levando em conta os saberes previstos para que um aluno tenha boas condições para a próxima série. Porém, esses saberes não compreendem somente conteúdos curriculares, mas, também, interação social, como esse aluno se porta em atividades de leitura e escrita, como ele desenvolve um raciocínio crítico, até o modo como interagem socialmente, demonstrando suas emoções, necessidades e sentimentos. Ou seja, o seu comportamento e desenvolvimento coletivo.”, declara Márcia Fiates.
Outro ponto em que os alunos estão apresentando grande dificuldade é quanto a gestão de tempo. “As atividades presenciais, seja ir à escola ou uma atividade como natação, aula de inglês, entre outras, são os chamados ‘organizadores externos’, que ajudam as crianças e adolescentes a gerirem o seu tempo. Ter a disciplina e o planejamento de uma rotina, com horários dedicados a cada tarefa. Como em 2020 essa rotina foi interrompida, agora eles estão com mais dificuldade de “entrar no ritmo”, além de ficarem mais exaustos, o que prejudica o momento em que eles deveriam se dedicar para revisar os conteúdos em casa, fazer as tarefas ou se preparar para uma prova.”, explica a pedagoga.
Dra. Deisy Mendes Porto orienta aos pais e professores a estarem atentos tanto ao desenvolvimento acadêmico quanto à saúde mental das crianças e dos adolescentes. “Ao longo do segundo semestre letivo, pais e profissionais do ensino devem observar para além do desempenho escolar de seus filhos/alunos e avaliarem se a criança necessita de reforço escolar ou uma ajuda psicológica e psiquiátrica, caso apresente alterações de humor ou cognitivas mais acentuadas. Passamos por muitas mudanças bruscas, ter uma atenção a mais, neste momento, pode prevenir situações mais delicadas, tanto no desempenho escolar quanto emocionais e de saúde mental, vale ficar atento.”, finaliza a presidente da ACP.
Sobre a ACP
A ACP é uma entidade científica sem fins lucrativos dos psiquiatras do Estado de Santa Catarina. Filiada à Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), a ACP foi fundada em 1965. Desde então, dirige suas ações para o aprimoramento científico e técnico de seus associados, para o desenvolvimento da área médica da Psiquiatria, divulgando e esclarecendo a comunidade leiga sobre temas ligados à Saúde Mental.